"Dia desses aconteceu comigo. Será que essa experiência já ocorreu com você?
Fazia tempo que não ia com calma para o centro, então, passeava sem um definido objetivo.
Percorria as ruas, serenamente, olhando as vitrines e suas roupas e sapatos e botas, e os pipoqueiros, e o vendedor de pão de queijo, e os artesãos e as gentes passando ligeiras.
E procurava volumes, claro. Entrava nas livrarias em busca de encomendas: um livro em falta é problema para toda a cadeia literária.
Ia devagar, aproveitando o momento de paz quando olho para frente e reencontro uma amiga de muitos anos:
e logo trocamos um abraço apertado de leal saudade.
Engraçado porque, da última vez que nos vimos, foi desconcertante para ambas: desentendemos-nos pelos motivos que eu tinha certeza estar com a razão. Mas, como o tempo tudo cura, não havia mais ressentimentos.
Sem compromissos imediatos, fomos a uma confeitaria.
Refrigerantes, guardanapos, canudos e uma imensa fatia de torta de rocambole de chocolate à frente, desatamos a conversar.
Das vidas atuais, passamos às amenidades e entramos no terreno da desativação do nó.
Aquele nó.
O que foi muito bom para mim: tranquila, ela expôs seus sentimentos retos e de forma ponderada, conversando com extraordinária lisura.
E foi firme: disse que, mesmo gostando de mim, nós sendo ótimas amigas, combinando pensamentos e preferências, escolheu ruir nossa amizade para sempre, do que ir em frente por um equívoco de cálculo meu.
E pude compreender que seu afastamento foi um ato de muita coragem.
E percebi que ela foi o melhor de nós duas.
(Maria Valéria de Lima Schneider)”